Escravos
Um corpo massacrado, carnes rasgadas
Carnes rubras, cortadas pelo chicote
Como se o corpo do homem fosse lingote
Capaz de suportar tantas chibatadas
A vida é um sopro que a pouco se esvai
E nenhum ser humano é um farrapo
Pra ter dele a repugnância de um sapo
Ao ponto de chicoteá-lo, até que cai.
E o pobre do escravo desfalecido
Escorrendo sangue nos cantos da boca
Os lábios inchados, como coisa oca
Vai ficando febrilmente adormecido.
Já cobrem seu corpo nuvens de mosquitos
Que encontram pasto fácil num indefeso
Que além de acorrentado, não está ileso
Sendo forçado a puxar os monólitos
E enquanto isso, seus senhores, os poderosos
Deleitam-se das agruras dos coitados
Que sobre as ricas leiteiras, recostados
Vêm os escravos morrer sequiosos.
E os pobres tresloucados, sem ais, sem gritos
São vítimas de mordazes salafrários
Que satisfazem seus gozos cruciferários
Construindo fabulosas montanhas de granitos
Baldados esses trabalhos desumanos
Desse múmias de pensamentos insanos
Que além da morte, amam obstinadamente
O mísero corpo, que deixarão para sempre
Na pequenez de suas almas etéreas
Cheias de pestilência, cheias de misérias
Acobertadas de vinganças impiedosas,
Fazem de seus corpos, múmias majestosas!
Sem Lembrarem de seu espírito imortal
E de praticarem o bem, em vez do mal
Trazem acorrentados como condenados
Homens e mulheres que a troco de ducados
Lhes compraram, os corpos e a liberdade
De seres humanos, fizeram animais
Criaram monstros, feras, coisas brutais
Sem um mínimo anelo de humanidade.
Desses pobres coitados, tenho piedade
Porque eternamente serão mais desgraçados
Do que mesmo, essa falange de coitados
De quem hoje escarnecem a liberdade
E os pobres escravos, sempre açoitados...
Sempre forçados a puxar monólitos
Para construir monumentos de granito
Onde serão os seus senhores sepultados
Maltratados, vão sendo dia após dia
Mas um dia... eles serão recompensados!
E os seus senhores, serão então condenados
Por tão maldosa e perversa tirania .
São Paulo, 09-05-1964
Armando A. C. Garcia
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